A HABILITAÇÃO DOS DEPENDENTES À PENSÃO: DIREITO SUCESSÓRIO X ARTIGO 112 DA LEI 8213/91: QUEM É O TITULAR DAS PARCELAS ATRASADAS DA APOSENTADORIA DE SEGURADO FALECIDO?

A pensão por morte é um direito de todo contribuinte, ainda que o mesmo não tenha declarado ninguém como dependente. O benefício é pago somente após o falecimento do segurado pelo INSS e quem recebe são os filhos ou companheiro, desde que a união seja comprovada através de documento autenticado em cartório.

O pagamento da pensão por morte é feito aos seguintes dependentes:
  • cônjuge ou companheiro;
  • filhos menores de 21 anos ou incapacitados;
  • ex-companheiros que recebem pensão alimentícia para cuidar dos filhos do falecido
  • Pais e irmãos, capazes de comprovar a dependência financeira.
Da leitura dos artigos 74 a 79 Lei 8.213/91, dos arts. 105 a 115 do Decreto 3.048/99 e da IN 77/2015, nos arts. 364 a 380, fica evidenciado que o foco do referido benefício é direcionado para os beneficiários que sejam dependentes em vida do instituidor da pensão, se afastando do conceito de herdeiros, típico do direito sucessório.

O direito ao recebimento da pensão por morte do falecido segurado pela viúva, dos filhos ou, ainda, outros beneficiários, dependentes legais, presumidos ou aqueles que devam provar sua dependência, não tem maiores controvérsias além da condição de segurado do de cujus, pagamento da carência, quando for o caso, bem a ordem de preferência dos beneficiários.

No entanto, há uma situação em particular que cria um intenso conflito entre os dependentes legais e os pretensos herdeiros, que possuem direito à herança, já que a lei previdenciária dispôs também, em seu artigo 112, do tema, criando assim uma regra especial ao direito sucessório, em que os dependentes habilitados à pensão por morte recebem, exclusivamente, os valores não recebidos em vida pelo segurado, deixando os herdeiros legais, da legislação civil, com o direito remanescente, subsidiário, secundário.

O art. 112 da Lei nº 8.213/91 expressamente determina:

“Art. 112. O valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independente de inventário ou arrolamento.”

Nesse sentido, uma vez que há dependentes habilitados à pensão por morte integrando a lide, deve ser afastada a habilitação da sucessora maior e capaz, que não ostenta a condição de dependente previdenciária.

A partir dessa leitura, tem-se que somente será necessário habilitar os herdeiros se inexistirem dependentes previdenciários.

Efetivamente, a orientação desta Corte é a de que, tendo o segurado falecido deixado filhos maiores e capazes, como in casu, apenas a companheira com quem convivia, cuja relação estável fora reconhecida judicialmente, é quem sucederá na demanda, podendo levantar o guerreado valor de precatório, pois é a única dependente previdenciária, tanto que já recebe o benefício de pensão por morte. Nesse sentido, destaco os seguintes precedentes (os grifos não pertencem ao original):

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENSÃO POR MORTE. HABILITAÇÃO DE HERDEIROS. COMPANHEIRO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. MICROPRODUTOR RURAL. 1. A partir da leitura do art. 112 da Lei 8.213/91, somente será necessário habilitar os herdeiros se inexistirem dependentes previdenciários. 2. Na hipótese da segurada falecida deixar filhos maiores e capazes, apenas o companheiro com quem era casada, sucederá na demanda, único dependente previdenciário. 3. A gratuidade da justiça está prevista nos artigos 98, caput, e 99, §§ 2º e 3º, do CPC, que pode ser concedida à pessoa física que declarar não possuir condições de arcar com as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios, estabelecendo-se uma presunção iuris tantum, sem prejuízo de ser ilidida por prova em contrário no curso da ação previdenciária. 4. No caso trazido a lume no presente recurso, é presumível supor, considerando-se as dificuldades enfrentadas pelo pequeno produtor rural, que seus rendimentos efetivamente não possam ser considerados expressivos. (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5002078-97.2018.404.0000, 5ª Turma, Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 20/04/2018)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. ÓBITO DO SEGURADO. HABILITAÇÃO. DEPENDENTES PREVIDENCIÁRIOS. ART. 112 DA LEI N° 8.213/91. SUCESSORES. 1. Nos termos do art. 112 da Lei n.º 8.213/91, o valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte, ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento. 2. Uma vez que há dependentes habilitados à pensão por morte integrando a lide, deve ser afastada a habilitação da sucessora maior e capaz, que não ostenta a condição de dependente previdenciária. (TRF/4ª Região, Turma Suplementar, AG nº 2007.04.00.017489-6, D.E. 24/08/07, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, unânime)

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL. HABILITAÇÃO DE DEPENDENTE. REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. VÍCIO SANADO NO CURSO DO PROCESSO. INOCORRÊNCIA DE PREJUÍZO PROCESSUAL. NULIDADE NÃO RECONHECIDA. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. CONVERSÃO DA APOSENTADORIA EM ESPECIAL. INÍCIO DO BENEFÍCIO. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. 1. O vício processual sanado no curso do processo judicial, decorrente da falta de oportuna habilitação do dependente previdenciário resta sanado com o seu comparecimento em juízo e a ratificação dos atos processuais. Trata-se, ademais, de direito transmissível, ainda que com termo final na data do óbito. 2. O valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento. (artigo 112 da Lei 8213/91). 3. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida. 4. Tem direito à aposentadoria especial o segurado que possui 25 anos de tempo de serviço especial e implementa os demais requisitos para a concessão do benefício. 5. A aposentadoria especial é devida a contar da data do requerimento administrativo na hipótese de não haver desligamento do emprego quando do seu requerimento, nos termo do art. 49, letra “b”, da Lei 8.213/91, devendo ser pagas as parcelas devidas até a data do óbito da segurada, com reflexos na pensão por morte de que é titular o viúvo. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5003437-12.2010.404.7001, 5ª TURMA, Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 14/04/2014)

As parcelas atrasadas do benefício já concedido, tendo em vista a regra constante do artigo 1.790, caput, do Código Civil (‘a companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável’), sob pena de restar configurado enriquecimento sem causa, não tem respaldo legal, conforme artigo 1.790 do Código Civil.

Tem sido essa linha, aliás, seguida pelos tribunais pátrios, vejamos:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. HABILITAÇÃO DE DEPENDENTE HABILITADA À PENSÃO POR MORTE COMO SUCESSORA DO SEGURADO FALECIDO. DESNECESSIDADE DE LITISCONSÓRCIO ATIVO ENTRE TODOS OS SUCESSORES SEGUNDO A LEI CIVIL. ART. 112 DA LBPS. O art. 112 da Lei n. 8.213/91 torna suficiente, para que os habilitandos em função do falecimento de segurado da Previdência sejam considerados parte legítima a propor ação ou dar-lhe prosseguimento em sucessão ao de cujus, o fato de serem dependentes deste habilitados à pensão por morte ou, não os havendo, o fato de serem seus sucessores segundo a Lei Civil, independentemente de inventário ou arrolamento. (TRF4, AG 0007243-55.2014.404.0000, Quinta Turma, Relator Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 16/03/2015) 

A respeito, lecionam os Ilustres Magistrados Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, in Manual de Direito Previdenciário, 15ª edição, Ed. Forense, p. 600:

“O valor não recebido em vida pelo segurado somente será pago a seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, na falta deles, a seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento, consoante previsão contida no art. 112 da Lei nº 8.213/91. Nesse sentido: TRF da 4ª Região, Embargos Infringentes em AC n. 2000.70.00.001185-1/PR, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, sessão de 14.11.2001.”
Em igual sentido, registro precedentes das Turmas integrantes da 3ª Seção deste Regional:

AGRAVO. EXECUÇÃO. PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. HABILITAÇÃO DE DEPENDENTE HABILITADA À PENSÃO POR MORTE COMO SUCESSORA DO SEGURADO FALECIDO. DESNECESSIDADE DE LITISCONSÓRCIO ATIVO ENTRE TODOS OS SUCESSORES SEGUNDO A LEI CIVIL. ART. 112 DA LBPS. 1. O art. 112 da Lei n. 8.213/91 torna suficiente, para que os habilitandos em função do falecimento de segurado da Previdência sejam considerados parte legítima a propor ação ou dar-lhe prosseguimento em sucessão ao de cujus, o fato de serem dependentes deste habilitados à pensão por morte ou, não os havendo, o fato de serem seus sucessores segundo a Lei Civil, independentemente de inventário ou arrolamento. 2. A observância das regras gerais do CPC a propósito da legitimação ativa dos dependentes ou da habilitação de todos os sucessores nos autos acaba por inviabilizar o direito de ação para essas pessoas, especialmente quando há filhos maiores, que devem ser localizados e trazidos aos autos por meio de procuração e comprovação da filiação. Tal resultaria em indevido prestigiamento das normas instrumentais, em detrimento da efetiva realização do direito substancial, especialmente quando há norma especial de processo previdenciário que autoriza solução adequada a torná-lo efetivo. Precedentes do STJ. 3. Perfeitamente cabível o deferimento da habilitação ao viúvo da segurada, habilitado à pensão por morte, sem a inclusão, no pólo ativo do feito, dos demais sucessores do demandante segundo a Lei Civil. (TRF4, AG 2009.04.00.044607-8, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 18/03/2010).

Do mesmo modo:

PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL ANTERIOR AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO DE CONHECIMENTO. COISA JULGADA. ART. 112 DA LEI Nº 8.213/91. DOCUMENTOS. COMPROVAÇÃO DE PAGAMENTO. 1. A prescrição pode ser alegada a qualquer tempo, em qualquer instância, pela parte a quem aproveita, no entanto, tratando-se de execução de sentença, somente poderá ser alegada a prescrição superveniente ao título executivo judicial, sob pena de ofensa à coisa julgada. 2. Conforme previsão do art. 112 da Lei nº 8.213/91, a viúva, beneficiária do benefício de pensão por morte, independentemente de inventário, é parte legítima para figurar no pólo ativo da execução. 3. Os documentos juntados pelo INSS são hábeis para comprovação de pagamentos na esfera administrativa, desde que não produzida prova em contrário, porquanto em seu favor milita a presunção da veracidade (art. 334, inc. IV, CPC), devendo os valores apontados serem deduzidos do cálculo exeqüendo. (TRF4, AC 2000.70.00.009871-3, Quinta Turma, Relatora Maria Isabel Pezzi Klein, D.E. 16/11/2009)
Outro não é o entendimento do egrégio Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. ART. 112 DA LEI 8213/91. LEGITIMIDADE DE HERDEIRO PARA AJUIZAR AÇÃO PARA PERCEPÇÃO DE VALORES NÃO RECEBIDOS EM VIDA PELO SEGURADO FALECIDO. INVENTÁRIO OU ARROLAMENTO. DESNECESSIDADE. Prescreve o mencionado art. 112 da Lei nº 8.213/91, ad litteram: “O valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento.” Como se observa, poderão os valores devidos e não pagos ao segurado falecido ser percebidos pelos seus dependentes ou sucessores, desde que, evidentemente, provada essa condição, independentemente de inventário ou arrolamento. A letra da lei é clara e, a bem da verdade, apenas ratifica regra que já estava consagrada no regime previdenciário anterior (reproduzida no art. 212 do Decreto 83.080/79). Em suma, o artigo consagra verdadeira exclusão do ingresso dos valores no espólio e introduz regra procedimental e processual específica que afasta a competência do Juízo de Sucessões, conferindo legitimação ativa ao herdeiro ou dependente para, em nome próprio e em ação própria, postular o pagamento das parcelas. De lado outro, a tese de que o mencionado artigo somente teria aplicação em sede administrativa não parece, salvo melhor juízo, procedente. Recurso desprovido. (REsp 603246/AL, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 12/04/2005, DJ 16/05/2005, p. 384)
Igualmente:

RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE DE HERDEIRO PARA AJUIZAR AÇÃO PARA PERCEPÇÃO DE VALORES NÃO RECEBIDOS EM VIDA PELO SEGURADO FALECIDO. ARTIGO 112 DA LEI Nº 8.213/91.
1. “1. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é firme na atenuação dos rigores processuais da legitimação, reconhecendo-a, por vezes, ao herdeiro, ele mesmo, sem prejuízo daquele outra do espólio.
2. ‘O valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento.’ (artigo 112 da Lei nº 8.213/91).
3. Em sendo certo, para a administração pública, a titularidade do direito subjetivo adquirido mortis causa e a sua representação, no caso de pluralidade, tem incidência o artigo 112 da Lei nº 8.213/91, que dispensa a abertura de inventário, nomeação de inventariante ou alvará judicial de autorização.” (REsp 461.107/PB, da minha Relatoria, in DJ 10/2/2003). 2. Recurso improvido.
(REsp 546497/CE, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 06/11/2003, DJ 15/12/2003, p. 435). Ante o exposto, voto no sentido de dar provimento ao agravo de instrumento. É o voto. Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON. Relator.

Data Máxima Vênia, não nos parece ser a interpretação mais acertada para solucionar o caso. Isto porque dois - e distintos - são os momentos e fundamentos do fato gerador do recebimento dos valores.

Há de se distinguir o direito à pensão, que ocorre com a morte do segurado e visa proteger seus dependentes legais, então beneficiários do benefício, com o valor de benefício, por exemplo, de aposentadoria, que o obituado teria recebido em vida.

Vale deixar claro, o segurado que requereu o benefício em vida tem, em tese, um direito, do qual é ele o titular e não se confunde com o benefício destinado a seus dependentes, sendo que, nesse segundo caso, são os beneficiários da pensão por morte os titulares do direito discutido.

Não se trata do mesmo fato gerador o requerimento do benefício em espécie pelo segurado que o exerceu em vida, todos com requisitos bem delineados pela legislação previdenciária, que proíbe, inclusive, a solicitação do benefício post mortem, caso não tenha feito o requerimento antes da ocorrência do óbito, uma vez que para a pensão por morte há de existir necessariamente esse evento para que os dependentes do segurado falecido sejam considerados como legitimados a exercê-lo.

É para se dizer: o direito do dependente se beneficiar da pensão só ocorre com a morte do segurado, enquanto esse somente pode requerer seus direitos e os benefícios que lhe são próprios enquanto estiver em vida, vez que o exercício do direito ao benefício previdenciário tem caráter personalíssimo.

À luz da legislação em comento – previdenciária e civil – temos dois dispositivos legais a serem analisados e que restaram invocados pelas partes envolvidas, dispositivos esses que a seguir transcrevo para melhor compreensão da matéria e assim rezam:

Art. 112 da Lei 8.213/91 dispõe: O valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento.
Art. 1.790 do CC dispõem: A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: (Vide Recurso Extraordinário nº 646.721) (Vide Recurso Extraordinário nº 878.694)
I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;
II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;
III – se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;
IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.

A partir da leitura do art. 112 da Lei 8.213/91, o valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte, ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento. Uma vez que há dependentes habilitados à pensão por morte integrando a lide, deve, por este norma, ser afastada a habilitação da sucessora maior e capaz, que não ostenta a condição de dependente previdenciária.

Partindo dessas considerações transcreve-se o trecho que faz refletir a questão em exame, em obra de “Direito Processual Previdenciário”, cujos pertinentes comentários trazidos pelo nobre magistrado José Antônio Savaris:

Na seara previdenciária, o caráter personalíssimo do direito significa que apenas o segurado pode requerer o benefício a que, em tese, faz jus. Significa, ainda, que se extingue o direito ao benefício, quanto às prestações supervenientes ao óbito de seu titular. Sem embargo, os efeitos patrimoniais da relação jurídica que o segurado mantinha com o instituto previdenciário ou, mais especificamente, os valores que não foram reconhecidos administrativamente embora devidos ao falecido – o que pressupõe lesão, em tese, a direito do falecido segurado – podem ser buscados judicialmente pelo espólio, porque constituem direitos que efetivamente se transferem aos sucessores,como se verifica:
Aqui cumpre fazer uma distinção entre as diferenças não recebidas em vida em razão de ser titular de aposentadoria por tempo de serviço, das prestações futuras em razão da revisão da RMI desta. O direito a continuar recebendo o benefício é personalíssimo ou inerente à figura do segurado inventariado, portanto, extingue-se na medida que o sucessor não é a continuação da pessoa do antecessor. Já no caso da relação jurídica de ser credor da previdência em razão de débito passado que o referido ente teria com o finado, tal direito é transmitido, integralmente, aos herdeiros junto com o direito de propor a respectiva ação para assegurar a satisfação de tal pretensão.
(SAVARIS. José Antônio, Direito Processual Previdenciário. 7ª ED. Curitiba: Alteridade, 2018, p. 422/429)
Igualmente com argumentos ponderáveis, Luiz Fernando Crespo Cavalheiro manifesta-se pela inaplicabilidade deste dispositivo nas ações previdenciárias: 

“O que se pretendeu com a regra antes mencionada foi simplificar o pagamento de eventuais prestações previdenciárias devidas ao ex-segurado. Ou seja, como a data de falecimento não coincide, em regra com o último dia do mês, as parcelas compreendidas entre o início do mês e a data de início da pensão previdenciária, são devidas ao de cujus e, por isso, integram a sua herança. Entretanto, conhecendo as dificuldades econômicas da maioria dos segurados da Previdência Social, bem assim o valor ínfimo de tais parcelas o legislador autorizou o pagamento desses saldos diretamente àquelas pessoas que sucederam o segurado para efeito de recebimento do benefício. Todavia, isso, não pode ter aplicação relativamente aos demais créditos do de cujus, ainda que oriundos de benefícios previdenciários: esses créditos integram o patrimônio do morto e, por isso, devem ser partilhados segundo a regra geral de sucessões”.(ROCHA, Daniel Machado da; JÚNIOR José Paulo Baltazar. Comentários à lei de benefícios da Previdência Social. 10 ED. Porto Alegre. Livraria do Advogado Editora; Esmafe, 2011)

Tomando por base tais premissas, a solução mais equânime a ser dada é o reconhecimento do direito dos herdeiros e aí compreenda-se filhos e cônjuge/companheira, levando-se em conta a natureza eminentemente patrimonial do ex-segurado. 

Portanto, não se pode confundir o exercício do direito à pensão por morte, cujo titular é o beneficiário, dependente, com os valores atrasados de um benefício que o de cujus requereu em vida, pois neste o instituto de direito existente é o da saisine onde a transmissão dos bens é imediata desde a morte do de cujus.

Com o devido respeito aos pensamentos diversos, mas não parece ser correta a aplicação do dispositivo previdenciário do artigo 112 da lei 8213/91 em detrimento do princípio da saisine, especialmente porque o direito hereditário tem vocação constitucional de status fundamental, pelo que qualquer norma que disponha contra o artigo 5º, Inciso XXX/ da Constituição da República Federativa do Brasil, deve ser considerada nula, porquanto trata-se de norma inconstitucional.

Melhor seria que ao aplicar a lei no caso concreto os tribunais procedessem com uma interpretação lógico-sistemática em conjunto com a hermenêutica teleológica do ordenamento jurídico e  que compatibilizasse a literalidade da lei:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENSÃO POR MORTE. FASE DE EXECUÇÃO DE SENTENÇA. PAGAMENTO DE PARCELAS ATRASADAS DEVIDAS EM VIDA AO FALECIDO. DIREITO DOS HERDEIROS NECESSÁRIOS E DEPENDENTES PREVIDENCIÁRIOS AO PERCEBIMENTO. RATEIO.1. As parcelas atrasadas que eram devidas em vida ao falecido dizem respeito ao patrimônio do “de cujus”, cujos sucessores/filhos/ herdeiros necessários do falecido e dependentes previdenciários possuem igualdade de condições ao percebimento, principalmente em razão de que o fato gerador da lide, agora em fase de execução, trata-se de valores patrimoniais do segurado, implicando a análise do caso frente ao direito sucessório e não meramente sob um olhar voltado ao benefício previdenciário propriamente dito.2. A a solução mais equânime é o reconhecimento do direito dos herdeiros e aí compreenda-se filhos e companheira, levando-se em conta a natureza eminentemente patrimonial do ex-segurado, cujo montante aferido será rateado, com desbloqueio e emissão do competente precatório.(TRF4, AG 5013208-89.2015.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relator para Acórdão JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 08/03/2019).
Portanto, é de se concluir que, uma vez compreendido que os valores não recebidos pelo segurado em vida compõem a herança, o entendimento segundo o qual afasta o direito ao recebimento pelos herdeiros quando exista indicação de dependentes, não se coaduna com a melhor aplicação do direito, sendo incompatível com a disposição constitucional.

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